segunda-feira, 26 de novembro de 2012

As mulheres da minha cidade


Às mulheres da minha cidade
basta um raio de sol para florirem.
Mesmo no Outono, como agora,
aparecem habitando de asas
as ruas por onde vão voando.
Como brilha o seu corpo!
A face, anúncio de alvorada,
é a luz de si mesmas e a minha;
os passos, o chão que pisam;
o cabelo, a aragem e logo o vento
que me leva também voando.
Ah! a lânguida colina do ventre
que baila baila caminhando baila
devagar a dança suave, as ondas do mar!
Olhos que são líquidos lagos por vogar,
rútila romã, a boca a todos dada
e a ninguém, que é só delas,
das mulheres da minha cidade
que salpicam de cores de pétala
as pupilas do desejo que prevalece.

Com as mulheres da minha cidade
a vida, sendo hoje, é sempre amanhã:
amadurecem nos seios o dom do tempo.
Que perpétuo o seu caminhar!
De tão longe lhe vem o ritmo e para
tão longe vai, cálido baloiço das ancas,
berço onde a respiração se detém,
esperando a noite de perfume a pasto
que não sei, ninguém sabe de quem será.

Sei que arderão algures
na Via Láctea. Mas sei também
que a sua boca me ateará o sangue,
que os dentes tão brancos me prenderão,
que as coxas se abrirão para que me contenham,
que pernas e pés me firmarão para que elas me possuam,
que unhas hão-de rasgar-me a pele para que de mim se levantem,
ah! que gemidos e gritos e choros te clamarão, ó noite, para que o sol expluda!

E em mim sejam, que eu o sou em tudo,
que tudo sinto, que tudo tenho, plenas de mundo,
certeza de vida - as mulheres da minha cidade!

por Manuel Rodrigues
fotografia de Ruslan Lobanov