quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

Nas ervas


Escalar-te lábio a lábio,
percorrer-te: eis a cintura
o lume breve entre as nádegas...
e o ventre, o peito, o dorso
descer aos flancos, enterrar

os olhos na pedra fresca
dos teus olhos,
entregar-me poro a poro
ao furor da tua boca,
esquecer a mão errante
na festa ou na fresta

aberta à doce penetração
das águas duras,
respirar como quem tropeça
no escuro, gritar
às portas da alegria,
da solidão.

porque é terrivel
subir assim às hastes da loucura,
do fogo descer à neve.

abandonar-me agora
nas ervas ao orvalho -
a glande leve.

por Eugénio de Andrade
fotografia de Garm

sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

Amoreto V


Quiero ver en tus ojos el destello,
la inquietud de mi fibra, el rocío
en tus manos asidas a mi río,
el recodo en que habita lo más bello.

Quiero ser en la sangre de tu sello
hoja hueva en el vaso antes vacío,
ser, amor, tu sabor en el estío,
la delicia en el pulso de tu cuello.

Quiero andar tu sudor y tu saliva,
atreverme a probar el agua viva
que en tu beso refleja la dulzura

del estanque aromado y su tersura;
agua rauda y ardiente que cautiva
brillo de agua que colma mi hendidura.

por Ethel Krauze
fotografia de autor desconhecido

segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

Frémito do meu corpo...

Frémito do meu corpo a procurar-te,
Febre das minhas mãos na tua pele
Que cheira a âmbar, a baunilha e a mel,
Doido anseio dos meus braços a abraçar-te,

Olhos buscando os teus por toda a parte,
Sede de beijos, amargor de fel,
Estonteante fome, áspera e cruel,
Que nada existe que a mitigue e a farte!

E vejo-te tão longe! Sinto a tua alma
Junto da minha, uma lagoa calma,
A dizer-me, a cantar que me não amas ...

E o meu coração que tu não sentes,
Vai boiando ao acaso das correntes,
Esquife negro sobre um mar de chamas...

por Florbela Espanca
fotografia de Artemis

sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

Fantasía



Desnuda, débil, ansiosa
arrimo el cuerpo al bosquejo
de tu imagen.

Con la fantasía diluida en la piel
contemplas silencioso la cercanía
el calor sudado que expelen mis poros.

Lento, abro mi boca, un volcán consume
seca esta ansiedad y suplico más.

Más de esta angustia derrochadora,
más de este puñado apocalíptico
más de este misterio.

Una fugaz eternidad humedece
el racimo de mis entrepiernas
y condensada busco en la aurora
un apellido para este sueño.

Sutil, desnuda, débil, semi plena,
semi complacida, masturbada contemplo
mis dilatadas pupilas frente al espejo
que silencioso no dice nada.

por Silvia Rodríguez Bravo
fotografia de autor desconhecido

sexta-feira, 1 de janeiro de 2016

Mimosa boca errante



Para todas as minhas leitoras, com votos de um Feliz Ano de 2016!!

Um beijo
Pedro M.


Mimosa boca errante
à superfície até achar o ponto
em que te apraz colher o fruto em fogo
que não será comido mas fruído
até se lhe esgotar o sumo cálido
e ele deixar-te, ou o deixares, flácido,
mas rorejando a baba de delícias
que fruto e boca se permitem, dádiva.

Boca mimosa e sábia,
impaciente de sugar e clausurar
inteiro, em ti, o talo rígido
mas varado de gozo ao confinar-se
no limitado espaço que ofereces
a seu volume e jato apaixonados
como podes tornar-te, assim aberta,
recurvo céu infindo e sepultura?

Mimosa boca e santa,
que devagar vais desfolhando a líquida
espuma do prazer em rito mudo,
lenta-lambente-lambilusamente
ligada à forma ereta qual se fossem
a boca o próprio fruto, e o fruto a boca,
oh chega, chega, chega de beber-me,
de matar-me, e, na morte, de viver-me.

Já sei a eternidade: é puro orgasmo.

por Car­los Drum­mond de Andrade
fotografia de autor desconhecido