terça-feira, 31 de julho de 2018

Língua vital



do que é que o corpo fala que idioma nenhum participa?
que nem o gesto mais sutil apreende?
só o toque no toque, de fato, transmite
os mistérios profundos que nos movem as entranhas

seria o sexo a única forma de comunicação real?
capaz de transpor fronteiras entre seres
e uni-los na verdadeira língua materna
sabedoria de gaia, pacha mama, ciclo vital

idioma que todos nascemos sabendo
e por não saber da própria sabedoria
acabamos, com esforço, esquecendo

chega um dia em que tal lembrança nos falta
e buscamos nas línguas e linguagens todas
a essência perdida que nunca carregam

por Bruna Escaleira
fotografia de autor desconhecido

terça-feira, 24 de julho de 2018

Tentación


Toma mi mano un momento,
será lo mejor que hayas vivido.
Será más que sólo un recuerdo,
serán tus deseos prohibidos.

Toma tu amor y tu odio,
tu violencia, tu vigor.
Toma tu cuerpo y tu alma,
y hazlos satisfacción.

¡Pues aquí no hay amor!
Sólo se vive de la pasión, del instante.
¡Aquí no hay luz!
Sólo necesitas sentir y entregarte.

Toma tu pudor y tu abstinencia,
tu inocencia, tu virginidad.
Toma tu Dios y sus reglas
¡Abandónalas y déjalas atrás!

por Arcanvm (Alejandro)
fotografia de autor desconhecido

quarta-feira, 11 de julho de 2018

Do desejo X



Pulsas como se fossem de carne as borboletas.
E o que vem a ser isso? perguntas.
Digo que assim há de começar o meu poema.
Então te queixas que nunca estou contigo
Que de improviso lanço versos ao ar
Ou falo de pinheiros escoceses, aqueles
Que apetecia a Talleyrand cuidar.
Ou ainda quando grito ou desfaleço
Advinhas sorrisos, códigos, conluios
Dizes que os devo ter nos meus avessos.
Pois pode ser.
Para pensar o Outro, eu deliro ou versejo.
Pensá-LO é gozo. Então não sabes? INCORPÓREO É O DESEJO.

por Hilda Hilst
fotografia de autor desconhecido

terça-feira, 3 de julho de 2018

Prazer



Sonhei esta noite... que a tua pele me envolvia por completo...
Senti a tua língua sofrega, intensa a vaguear pelo meu sexo...
Senti o meu corpo a relaxar, a abrir-se ao teu desejo...
Soltei um grito poderoso e pedi mais... a tua mão a brincar com o meu seio, a tua língua a entrar em mim, exigente...
O meu corpo elevou-se num arco para que me visses inteira...
Cerrei as mãos, porque o prazer entranhou-se em mim de tal maneira que fiquei dorida, exausta.
Gritei novamente e senti-te a preencher cada cantinho secreto do meu corpo...
E, depois... sorri-te...

de uma leitora anónima
fotografia de autor desconhecido

segunda-feira, 2 de julho de 2018

Do desejo IX



E por que haverias de querer minha alma
Na tua cama?
Disse palavras líquidas, deleitosas, ásperas
Obscenas, porque era assim que gostávamos.
Mas não menti gozo prazer lascívia
Nem omiti que a alma está além, buscando
Aquele Outro. E te repito: por que haverias
De querer minha alma na tua cama?
Jubila-te da memória de coitos e acertos.
Ou tenta-me de novo. Obriga-me.

por Hilda Hilst
fotografia de Konstantin Lelyak