domingo, 20 de setembro de 2009

Poema de Amor


Deito-me a teu lado. Sou a tua sombra
no lençol. Vou decifrar a luz dos teus olhos,
não me dás tempo. Os teus dedos tocam-me no rosto,
descem à garganta, começam a soletrar
o mapa do meu corpo: um grão sob a axila, uma pálpebra
que cintila, o rubor do mamilo
e já teus dentes se ocupam
do outro. Pressionas músculos e ossos
ao mesmo tempo que toco ao de leve
um seio, um lábio: quero deter-me no joelho
onde leio quedas na neve
e no ballet. Não me dás tempo.
Os corpos rodam, as mãos buscam outra terra,
outras águas. Os seios na virilha,
a barriga no pescoço. Estaremos a caminhar
demasiado depressa? Acaricias onde prometo
uma haste de sol. Uma casa voadora
na margem deste mundo tão previsível.
Erigimos com os nossos corpos
a mais efémera das esculturas. As tuas mãos
convidam-me a voar. Agora sou eu
quem não te dá tempo, escavando e descendo
à fenda silenciosa. Ouço-a. Um canto leve
e depois allegro e depois mais fundo.
Já não sei onde estou, quem sou
sobre as fontes e os rios e os abismos
de ti. Sentas-te, lama delicada, no meu peito
e desces e ajustas os teus ninhos
ao pequeno pássaro que pouco a pouco
se agita. Palpo e bebo e retenho a terra volátil.
a espuma, a vegetação de coxas, nádegas, mamas e águas
flutuantes. Ora subo ao chão ora me enterro
no ar, no lábio onde começa uma árvore
que se eleva até às nuvens. Não me dás tempo,
eu quero a eternidade mas tu não me dás tempo
para te contemplar. Ânfora nua
que bebo por fora e por dentro.
Dou-te a minha vida em troca da tua.

por Casimiro de Brito in 69 poemas de amor
fotografia de Bimbom


P.S.: confesso desconhecer o título deste poema, mas prometo tentar descobrir.

7 comentários:

Marta Vinhais disse...

Nesse desejo tão sentido em nada silencioso...
Porque se grita e o corpo todo ergue-se e abraça-se em ti.....
Um bom poema e uma foto bem enquadrada...
Beijos e abraços
Marta

"Afrodite" disse...

a pressa era tanta que nem lhe deu um título. aiai, por onde anda essa cabeça...

Anónimo disse...

Quem me dera que meu corpo fosse esse mapa e que o fosse percorrido pelos teus dedos...
Um beijo
Ana

Ana disse...

Quem me dera que meu corpo fosse um mapa percorrido pelos teus dedos.
E que teu corpo se embebedasse desses caminhos...
Beijos

Pedro M disse...

Ohhh Marta...

é a voz do corpo...

Um beijo

Pedro M disse...

Minha querida Afrodite,

confesso que simplesmente estava com muito sono :-)
Mas mesmo depois do seu comentário, os meus escrúpulos não me permitiram substituir-me ao autor. Mas pronto, identifiquei-o: é um poema de amor, amor carnal, terreno...


Um beijo

Pedro M disse...

mmm Ana...

com que gosto beberia nesses caminhos o doce néctar do prazer...

Um beijo